Vê se telefona, pra dizer que está bem, longe da megalomania
da cidade. Cheia de estúpidos humanos. Eu quero saber de você, se já
encontrou a baura perfeita, se já conheceu a menina dos olhos. Sinto sua falta, essa distância virtual afeta mais do que
quando você estava presente encolhido em meus braços. Ela quer dizer que você
não se lembra mais de mim. Porém, insisto em te mandar cartas, pelo menos você
deixou seu endereço, ou elas chegam até você, ou se perdem no meio do caminho.
Não precisa me responder, mas leia com atenção, a dor de sua perda me corrói um
pouco a cada dia, mas tenho lembranças boas dos nossos 36 meses juntos. Eu
quero dizer que te amo, e que sua felicidade me completa, assim como suas
carícias matinais em torno de minha barriga. Perder vocês me fez refletir
o quanto a vida é um sopro sutil. A minha morte, talvez, tivesse menos impacto
comparado ao infortúnio inferno astral em que me enredei. As vezes acordo de
noite e sinto os chutes incessantes que o nosso filho fazia dentro de mim, e
lembro do seu sorriso bobo quando sentia seu corpo inquietante. Esse é o
momento de te fazer lembrar que eu também sofri e que até hoje carrego a culpa
de não ter segurado pelo menos essa sua lembrança. Um pequeno pupilo de olhos negros e profundos, com o cabelo comprido e sorriso tão lindo quanto o seu. Esse
é o momento de deixar o nó na garganta se desfazer e, deixar transbordar pelo
rosto lágrimas frescas de uma lembrança amarga. Eu não te quero como homem, não
é fácil para mim falar sobre isso, é difícil de explicar, só quero que saiba
que sua existência me afeta e ainda quero olhar para você e te agradecer por
ter me salvo das garras de um amor cruel. Por ter me mostrado que a fase da
paixão é longa e que seu adeus me desmontou, e graças aos seus conselhos eu
soube me refazer de novo.